domingo, 24 de outubro de 2010

Você é corrupto?

   Existe, no Brasil, uma incidência muito grande de pessoas descontentes com a realidade social encontrada no país, e que costumam criticar o quadro político nacional, acusando-o de corrupto. Tais alvos abordados são, indiscutivelmente, justamente questionados e precisam ser revistos e alterados para que haja uma sociedade mais justa. Mas até que ponto cada um de nós, ditos cidadãos, nos mobilizamos para que isso se concretize?

   Apesar da existência de diversas mazelas sociais, o brasileiro, de maneira geral, adotou um comportamento marcado pelo comodismo, pois não se vê mais nenhum tipo de manifestação popular consistente contra o sistema vigente, mesmo que esse não agrade a maior parte da sociedade, mas que, ao invés disso, esse mesmo sistema beneficia apenas a ala menos numerosa da pirâmide social. Efetivamente, a última vez que existiu algum movimento questionador do quadro político nacional, e que teve grande força ideológica, ocorreu durante o período de ditadura militar, quando o povo foi às ruas e clamou por mudanças, lutou pelos seus DIREITOS, como dever cidadão, tendo em vista que um Estado deve se organizar ao modo que atenda a necessidade de TODA a sociedade, ou pelo menos a maior parte dela, mas nunca apenas uma estratificação limitada da mesma. Todas as manifestações ocorridas durante os anos de chumbo sucederam-se, inclusive, em um período onde os manifestantes não possuíam instrumentos de comunicação que hoje nós – e quando eu digo “nós” me refiro aos integrantes da geração pós-ditadura, extremamente acomodados e conformados com o que nossos pais conquistaram para nós - possuímos, e que, se devidamente utilizados, poderiam se transformar em importantes meios de divulgação de idéias e canais para protestos organizados.

   O famoso “jeitinho brasileiro” é muitas vezes tratado com orgulho dentro da nossa cultura, o que tem seu lado positivo quando se trata da questão da superação do brasileiro e que ele pode tudo superar com sua força de vontade. Mas o mesmo “jeitinho brasileiro” nos rotula como indivíduos malandros e espertos que, muitas vezes utilizamos de estratégias que fogem a ética e a moral para alcançarmos nossos objetivos. Se ao menos isso ficasse apenas na parte do folclore e fosse mais um título imposto e mal empregado pelo preconceito que existe no mundo para com o brasileiro, estaria tudo bem, entretanto, como já citei anteriormente, esse comportamento é motivo de orgulho para os próprios. Trago esse fenômeno à tona para mostrar que, de maneira contraditória, o cidadão tece diversas críticas para a situação do seu país – nesse caso, o Brasil – mas em suas atitudes cotidianas demonstra os mesmos pontos críticos da sociedade, mesmo sendo em uma menor proporção.

   O exemplo que eu irei usar para ilustrar e também fortalecer o meu argumento é uma prática bastante comum no cotidiano urbano: o suborno oferecido por infratores de trânsito aos guardas nas Blitz. Em primeiro lugar, o motorista já age de maneira errônea e imprudente no momento que comete uma infração, como dirigir em estado de embriaguez. Mas ao ser flagrado nessa situação tenta sair impune do ocorrido utilizando-se do popular “toco”, ou seja, através de suborno. O que eu quero que você perceba, meu caro leitor, é que o mesmo indivíduo que repugna e critica a corrupção da política brasileira acaba de se corromper, mas o fazendo como se natural fosse. Mas diferente do que você pode estar pensando neste momento, não corromper um guarda não deveria ser um motivo de orgulho e/ou de diferenciação social. Não corromper um guarda deveria ser um item básico dentro do comportamento de todo e qualquer cidadão.

   Mais do que isso: este último exemplo caracteriza um tipo de corrupção perceptível e sancionada por boa parte da sociedade. Por outro lado, existem atitudes corruptas intrínsecas ao comportamento do brasileiro – ou seja, que não acontece em situações casuais, mas no dia-a-dia. Furar fila em bancos, elevadores, cinemas, aeroportos, [...].

   Faltam referências. Faltam perspectivas. Tem-se primeiro que rever os conceitos e atitudes individuais para que depois seja possível objetivar mudanças em âmbitos maiores. Eu poderia citar muitos outros exemplos que deixam sociedade estagnada nesse limbo da desigualdade e corrupção, como a alienação das pessoas e sua conseqüente falta de conscientização política, mas esse é um tema que iremos abordar posteriormente.

   Pense, estude, construa argumentos, questione, critique, anseie por mudanças! Essa é a verdadeira chave para o desenvolvimento, talvez não o econômico, mas com certeza o social. Não se torne mais um alienado e acomodado, o mundo já está cheio desses. Comece com coisas pequenas, na realidade, coisas APARENTEMENTE pequenas, pois isso já faz muita diferença, isso já é um começo.

4 comentários:

  1. Apenas alguns breves comentários. Não é necessários ir tão longe para buscar manifestações sociais, não nos esqueçamos de 92 e do impeachment de Collor.

    Mas hoje existe um quadro de oito ou oitenta, existem muitos jovens engajados não apenas em movimentos políticos, mas também em movimentos sociais.

    Mas até que ponto esses jovens e esses movimentos são expostos aos nossos olhos?
    Até que a ponto a elite quer ver seus filhos enfurnados em guetos e favelas trabalhando com jovens carentes?
    Até que ponto uma juventude unida e ativa é incentivada? Ou é melhor para uma elite que é umbilicalmente ligada à mídia, mostrar e fazer presente um sentimento de inconformismo, mostrar e fazer valer uma ideia de que lutar não adianta, mostrar que lutar é errado, coisa de comunista retrogrado.

    Não podemos esquecer claro de um tratamento muito visto onde uma geração frustra os instintos revolucionários da geração seguinte, quase impondo a ideia de que lutar não é da nossa conta, quase que impondo a ideia de que só existe o EU. Criando uma cultura individualista onde nossos quartos com nossos bibelôs tecnológicos são nossos feudos pessoais e o mundo lá fora não passa de um ambiente hostil e canibal.

    Quando ouvimos a frase clássica, “Política é um lixo, por isso é bom não se envolver”, não só uma manifestação de descontentamento com a classe política é um atestado de conivência com os erros que ela, classe política comete, ficar longe é o pior erro que se pode cometer e ensinar.

    O melhor que podemos fazer é lutar com as armas que temos, se não temos armas devemos forja-las e o mais importante mostrar às gerações mais novas que a nossa que lutar não só é preciso como é necessário, que lutar seja em qual lado seja não é uma prova de rebeldia inconsequente mas é a máxima prova de amor ao nosso país.

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  2. A referência que nos falta é a contemporânea. Temos sim como nos espelharmos num passado, inclusive no citado no texto, mas precisamos da força nos dias atuais. E se não os temos, vamos nos tornar tal. Com um pequeno gesto, no dia-a-dia, devemos tentar contaminar as pessoas com a vontade de fazer o certo, estimular o censo crítico; isso ajuda a reconstruir uma sociedade corrompida.

    Vamo que vamo!

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  3. A principio a grande bronca que vejo nessa “corrupção cotidiana" é o julgamento que ele faz no ato da blitz, (por ex.) o corruptor entende isso como pequeno e valido ato, algo que só vai Atingi-lo, o corrupto partilha da mesma idéia, faz isso seguindo o mesmo pensamento em outros momentos ele(corrompido) faz juízo do crime tornando-o menor como a lei dita e assim deixando passar... Agora quando parte pra uma "macroestrutura" ele coloca o outro na jogada, enxerga nesse momento muito mais a luz da honestidade, solidariedade etc., ai muda tudo... saca?.

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  4. O texto está muito bom mesmo.

    Só um breve comentário para ressaltar a importância do texto.O bombardeio de "inovações" hoje é enorme, estamos em um campo de pensamentos isolados, as pessoas pensam por si nos seus devidos lugares e o espaço público se torna forma de "distracção". O entretenimento virou meta número em nossas vidas, e o mercado acolheu bem suas próprias ansiedades.

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