segunda-feira, 15 de novembro de 2010

E agora, seu Enem?

  Qual é, afinal, a função e o papel do Enem dentro do sistema educacional brasileiro? Ao fazer esta pergunta, o desvio é claro: o que eu escuto mais frequentemente são críticas revoltosas por conta dos problemas organizacionais presentes novamente neste segundo ano de aplicação do novo Exame. Como aceitar que o principal concurso público do país cometa erros graves e sucessivos, a modo de ferir e revoltar estudantes de todo o país, que se esforçaram ao longo do ano para dar o melhor na prova e obter um bom resultado? Mas, sobretudo, como eles, estudantes passionais, e cobertos de razão de "lutar" pelos seus direitos, podem enxergar e perceber a importância reestruturadora que o Exame Nacional do Ensino Médio propõe? Como entender que a ausência da tecnicidade, da "decoreba", e a presença de questões aparentemente ridículas são motivos de comemoração e sinais sutis e primeiros de uma revolução (por que não) do modo de ensino no Brasil?
  Pois bem, venho aqui para corroborar a revolta dos estudantes e de seus padrinhos professores. Não podemos permitir que erros como os destes dois últimos anos tornem-se costumeiros. O protesto é necessário e mais do que válido. É função social daqueles que se sentem lesados. Mas venho aqui também para fazer um alerta, em partes, mais "importante" que um protesto. Mais do que protestar, é saber por quê está protestando. Não é porque existem graves falhas administrativas e fiscalizatórias que podemos criticar o  formato conceitual do Exame, sem saber onde queremos chegar. O cunho socioambiental, a "unidade"cultural e a veemente recusa à tecnicidade exarcebada dos antigos vestibulares são uma marca do Enem, e demonstram uma tentativa salutar de mudar para melhor a forma de ensino dentro do nosso sistema educacional, que (sabemos) não vai bem das pernas há tempos. Porém, dentro disso, vem outra pergunta das vozes que me rodeiam: "como assim? Mudar de cima pra baixo?  O problema tá na base!"
  Em resposta: não concordo, nem discordo, MUITO pelo contrário. Parece ridículo, pode até ser, mas ao tentar entender e perceber as grandes qualidades do Enem e deixando de lado o cunho político de implantá-lo antes de ano eleitoral, é possível notar uma boa estratégia de mudança de base da educação no país. Senão na base, pelo menos no ensino médio. A forma como se ensina em boa parte do Brasil é a mesma: objetiva, restringida, dura, "crucificada" - devido a quantidade de cruzes que são feitas a cada resposta dada, plagiando Carlos Drummond de Andrade (ao comentar os antigos vestibulares cariocas). No Enem, as cruzes persistem. É a forma viável, ainda, de correção de provas. Entretanto, as questões são mais subjetivas. Arrisco em dizer: o Enem propõe provas objetivas-discursivas. Objetivas pelas cruzes; discursivas, pelos longos enunciados e pela insistência em questões interpretativas, no sentido primeiro da palavra: algumas questões possuem suas respostas no próprio enunciado. Isto, a olho nu, é um defeito grave e uma falta de conteúdo das questões. Mas de que conteúdo estamos falando? Será que  é mesmo importante saber os mínimos detalhes da revolução francesa? Do gás Hélio? Do atrito? Platão? Isso é obrigação do historiador, do químico, do físico e do filósofo, respectivamente.
  O Enem não propõe e nem pode consertar todos os problemas da Educação no Brasil. O Enem propõe mudar parte do ensino, de cima para baixo, de fora para dentro. O Enem entra nas escolas e elas procuram sua adaptação. O Enem pretende unificar o modo de ensino. O Enem busca um aperfeiçoamento, administrativo e conteudístico. Por isso, erra, causa revolta, e corre o risco de ser escanteado. Mas assim como é importante protestar, é importante termos o discernimento das inúmeras qualidades desta tentativa de mudança na Educação do país.


                                                                                      Por Vitor Bahia

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